Na última quarta-feira (12/06) a Câmara dos Deputados, dirigida por forças conservadoras, aprovou regime de urgência para o PL 1904/24, que equipara o aborto realizado após a 22ª semana de gestação ao crime de homicídio, com pena que pode chegar até 20 anos de cadeia. A urgência envia o PL diretamente para o pleno da Câmara, retirando a necessidade de discussão em comissões temáticas que contam com a contribuição de especialistas. Vale dizer, o processo de aprovação da urgência se deu em menos de 30 segundos.
Hoje a lei permite aborto em casos de violência sexual, risco à vida da gestante e quanto o feto é anencéfalo, com penas de 1 a 3 anos para abortos que desviam destas normas. O PL altera o direito das pessoas que abortam, com consequências especialmente cruéis para vítimas de abuso sexual, cuja prática pode levar a uma pena de 10 anos, metade do que é proposto para as pessoas que abortarem após 22 semanas.
Tal crime é comum no país e suas vítimas são em grande parte crianças. Dados do IPEC que apontam que a cada minuto no Brasil duas pessoas são vítimas de abuso sexual e que a cada ano quase vinte mil crianças menores de 14 anos são forçadas a ter filho. Quanto mais jovem a vítima mais tarde costuma ser descoberta a gestação, o que aprofunda as consequências da mudança proposta pelo PL 1904/24 para as faixas mais jovens de idade.
A provação do regime de urgência levou a manifestações históricas por todo o país contrárias às mudanças e a favor de avanços nas políticas reprodutivas. A legislação no Brasil já é uma das mais atrasadas do mundo e o PL 1904/24 pode inclusive desmotivar denúncias de violência sexual em caso de gravidez, protegendo os abusadores.
A ABRAPSO Nordeste expressa seu repúdio a este PL que vai na contramão do que precisamos enquanto sociedade: avançar na direção do aborto seguro e gratuito para todas as pessoas que gestam. Entendemos que direitos reprodutivos se constroem com a proteção da vítima de abuso sexual, não com sua revitimização por parte do Estado. O que este deve fazer é garantir uma rede de cuidado para as vítimas, além de acesso à educação sexual e reprodutiva para todas as pessoas.