ABRAPSO assina Nota Conjunta de Repúdio ao Deputado Jair Bolsonaro

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Nota de Repúdio ao Deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ)

 

Nota Pública Conjunta das Comissões de Direitos Humanos, órgãos auxiliares e permanentes da gestão dos Conselhos Regionais de Psicologia do Brasil, que guardam como função precípua a fiel e veraz observância e divulgação, junto à categoria e sociedade, dos princípios consagrados nos direitos humanos e garantias fundamentais, e de outras entidades do campo da Psicologia.

Considerando a Carta Internacional de Direitos Humanos, conjunto de instrumentos constituídos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas, em Paris, dada em 10 de dezembro de 1948, por via da Resolução n. 217-A (III), pelo Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (e seu protocolo opcional) e pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (e seus protocolos opcionais), pactos adotados pela Assembleia-Geral das Nações Unidas, em 16 de dezembro de 1966, via Resolução n. 2.200-A (XXI), como norma comum a ser acolhida, reconhecida e adotada por todos os povos e nações e que estabelece a proteção universal dos direitos humanos e, respectivamente, promulgados pelo Brasil, via decretos n. 591 e 592, ambos de 06 de julho de 1992;

Considerando a Convenção Americana de Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, adotada e aberta para assinaturas na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em San José de Costa Rica, em 22 de novembro de 1969 e promulgada pelo Brasil, via Decreto n. 678, em 06 de novembro de 1992;

Considerando a Convenção Internacional contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes, adotado pela Assembleia-Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1984, via Resolução n. 39/46, promulgada pelo Brasil, via Decreto n. 40, de 15 de fevereiro de 1991;

Considerando a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, dada em 24 de novembro de 2010, relativa ao Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) versus Estado Brasileiro, que, em sua decisão aponta que as disposições da Lei de Anistia brasileira que impedem a investigação e sanção de graves violações de direitos humanos são incompatíveis com a Convenção Americana, carecem de efeitos jurídicos e não podem seguir representando um obstáculo para a investigação dos fatos do presente caso, nem para a identificação e punição dos responsáveis, e tampouco podem ter igual ou semelhante impacto a respeito de outros casos de graves violações de direitos humanos consagrados na Convenção Americana ocorridos no Brasil, e ainda que o Estado Brasileiro descumpriu a obrigação de adequar seu direito interno à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, como consequência da interpretação e aplicação que foi dada à Lei de Anistia a respeito de graves violações de direitos humanos;

Considerando a Constituição da República Federativa do Brasil, também conhecida por Carta Cidadã, de 1988, que consolida o Estado Democrático de Direito e que, em seu Artigo 5º., prevê que ninguém, sob qualquer argumento, hipótese ou situação poderá ser submetido a tortura ou tratamentos cruéis e degradantes (inciso III) e que sua prática será considerada crime inafiançável e desassistido pelos instrumentos da graça ou anistia, respondendo os mandantes, os executores e aqueles que, podendo evitá-lo, se omitiram (inciso XLIII);

Considerando a Lei n. 9.455, de 07 de abril de 1997, que, no ordenamento brasileiro, define os crimes de tortura;

Considerando a Resolução do Conselho Federal de Psicologia – CFP n. 010, de 21 de julho de 2005, que aprova e promulga o Código de Ética Profissional do Psicólogo, que, entre seus Princípios Fundamentais, aponta que as/os profissionais da Psicologia subsidiarão seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiados nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos (Princípio I), que trabalharão visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuiremos para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (Princípio II) e ainda, que atuarão com responsabilidade social, analisando crítica e historicamente a realidade política, econômica, social e cultural (Princípio III);

Considerando a Resolução CFP n. 005, de 08 de março de 2012, que, em seu Artigo 2º. proíbe a/o psicológa/o de favorecer o uso de conhecimento da ciência psicológica e normatizar a utilização de práticas psicológicas como instrumentos de castigo, tortura ou qualquer forma de violência (alínea ‘c’);

Pelo instrumento da presente nota pública, MANIFESTAM o mais sincero, profundo, necessário e urgente repúdio às declarações, postura e comportamento de Jair Bolsonaro, Deputado Federal, ora filiado ao Partido Social Cristão do estado do Rio de Janeiro (PSC-RJ).

Por ocasião da sessão da Câmara de Deputados, realizada no dia 17 de abril de 2016, Domingo, na qual foi votada a admissibilidade de abertura do processo de impedimento de curso de mandato contra Dilma Rousseff, Presidenta da República, o Deputado Jair Bolsonaro, quando tomou lugar para pronunciar sua declaração de voto, fez uma larga, pública e desavergonhada homenagem para a pessoa, figura e atos de Carlos Alberto Brilhante Ustra, notório torturador e um dos contumazes beneficiários dos crimes, dos horrores, dos mau-feitos e dos excessos cometidos durante o último e recente período de vinte e um anos de Ditadura Civil-Militar, que vitimou nossa nação entre os 1964 a 1985.

Na fala do Deputado, seu voto favorável para a abertura do processo de impedimento de mandato da Presidenta era ofertado em nome da “memória do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff” (sic). Na sequência, Jair Bolsonaro, investido do mandato de Deputado, seguiu rendendo aberta apologia a um dos maiores torturadores da história da ditadura civil-militar brasileira.

Cumpre observar que o Coronel Brilhante Ustra, quando esteve à frente do Destacamento de Operações de Informação do Centro de Operações de Defesa Interna DOI-CODI do II Exército em São Paulo, entre os anos de 1970 a 1974, guardou responsabilidade – direta e/ou indireta – por prisões e detenções ilegais, torturas e maus tratos, execuções, extermínio e desaparecimentos forçados de cidadãos, ocultação de cadáveres e, nada menos que, quarenta e cinco assassinatos, conforme consignado no texto conclusivo do Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade – CNV. Por esse mesmo trabalho, Ustra, personagem de triste e nefasta memória, foi incluído na lista oficial de torturadores a serviço do regime militar, período no qual, ao menos, quatrocentas e trinta pessoas foram exterminadas, além de uma cifra de mais de seis mil vidas torturadas pelo Estado Brasileiro.

Em pleno período de recente experiência democrática, que vivemos desde o final da Ditadura e promulgação da Carta Cidadã, no qual iniciamos a construção de políticas públicas pautadas no reconhecimento, promoção e defesa de direitos humanos e garantias fundamentais, render homenagens e culto cívico público ao período de exceção (marcado por crimes e violações diversas) e aos seus mandantes, executores e àqueles que, podendo evitá-lo, se omitiram, entendemos que pode ensejar a mais descarada apologia a tudo que isso representa, quais sejam, crimes, desmandos, opressão, maus-tratos e ofensas de lesa-humanidade, em fim, violações diversas aos direitos humanos e garantias fundamentais.

Tal situação é intolerável ao regime democrático e, por aviltamento à cultura e ao ordenamento de direitos humanos, basilares ao exercício da Psicologia, ciência profissão, provoca a manifestação de nossa categoria. As declarações, postura e comportamento de Jair Bolsonaro, no episódio em tela, parecem-nos ser caso de apologia a um crime de lesa-humanidade, situação que, acreditamos, fere e atenta contra os princípios seminais dos direitos humanos, da Constituição Federal, do conjunto de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. Sobremaneira, o caso nos parece ser um violento ataque contra os sobreviventes da tortura, contra os familiares das vítimas da ditadura, contra a memória, justiça e verdade.

Por fim, manifestamos que esse episódio exige a mais rápida e eficaz atuação do Estado, sobremaneira, daqueles órgãos vinculados ao acesso à Justiça e preservação das garantias fundamentais. Entendemos que calar, ante a descarada afronta à cultura e ordenamento de direitos humanos, poderá traduzir consentimento. Tendo por base e por instrumento de orientação nosso Código de Ética do Profissional e legislações a ele atreladas, as Comissões de Direitos Humanos, dos diversos regionais que aqui subscrevem, ao lado de outras entidades da Psicologia, manifestam seu repúdio e exigem as mais urgentes reações do Sistema de Acesso à Justiça.
Sem mais, subscrevem a presente nota pública conjunta,

Por enquanto, assinam: Comissões de Direitos Humanos, órgãos auxiliares e permanentes da gestão dos Conselhos Regionais de Psicologia do Brasil (CRP-01, CRP-02, CRP-03, CRP-04, CRP-05, CRP-06, CRP-07, CRP-08, CRP-10, CRP-12, CRP-13, CRP-14, CRP-16, CRP-17, CRP-18, CRP-19, CRP-20), Sindicato dos Psicólogos de Mato Grosso do Sul (Sinpsi-MS), Sindicato dos Psicólogos de São Paulo (Sinpsi-SP), Sindicato dos Psicólogos do Estado do Ceará (PSINDCE), Sindicato dos Psicólogos do Estado de Minas Gerais (Psind-MG), Federação Nacional dos Psicólogos (FENAPSI), Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP), Associação Brasileira de Psicologia do Esporte (abrapesp), Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE), Representação Paulista da ABRAPEE, Associação Brasileira de Orientação Profissional (ABOP), Associação Brasileira de Editores Científicos de Psicologia  (ABECiPsi), Associação dos Assistentes Sociais e Psicólogos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (AASPTJ-SP) e Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO).