Convocação para o Tribunal Popular da Terra

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Prezado Conselho da ABRAPSO

Quero compartilhar uma informação com vocês…

Faço parte do “Tribunal Popular: o Estado Brasileiro no Banco dos Réus” e venho aqui divulgar nossa proposta do Tribunal Popular da Terra para que vocês tenham conhecimento. Temos buscado, como Tribunal Popular, o apoio de vários grupos em diversas regiões do Brasil (já temos articulação em quase todos os Estados brasileiros), assim, caso seja convidad@ para uma ação do Tribunal da Terra em sua região, já podem saber do que se trata!

Para mim, isso tem muito a ver com a Psicologia e com os profissionais que atuam junto às populações que estão nesse enfrentamento pela questão da terra (indígenas, quilombolas, trabalhadores rurais, sem-tetos, entre outros). Por isso, fica aqui a divulgação desta ação com o intuito de que tenham ciência dessas atividades.

Um abraço,

Adriana Eiko Matsumoto

O Tribunal Popular: o estado brasileiro no banco dos réus, convoca

os movimentos populares, os coletivos anticapitalista, os sindicatos, coletivos que produzem cultura, as populações indígenas, as comunidades quilombolas, caiçaras, ribeirinhas, grupos de lutas urbanas, movimentos de trabalhadores e trabalhadoras que lutam pela posse da terra e todos e todas lutadores e lutadoras sociais para

A construção do

Tribunal Popular da Terra.

Histórico

Durante os dias 4, 5 de 6 de dezembro de 2008 realizou-se em São Paulo, na tradicional Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, o Tribunal Popular: o Estado brasileiro no banco dos réus.

O Tribunal Popular é uma iniciativa que surge em 2008, com o aniversário de 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, quando uma série de entidades passou a discutir e refletir acerca das constantes violações aos direitos humanos cometidas pelo Estado brasileiro, reforçando seu modelo opressor e a serviço do capital, que tem como alvo privilegiado de suas ações as parcelas mais pobres da população brasileira e em especial a população negra e indígena.

Desde maio de 2008, uma vasta rede de entidades de direitos humanos, movimentos sociais, sindicatos, familiares de vítimas da violência policial e estatal, bem como militantes de diversos estados (São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais), inconformados com as arbitrariedades e o extermínio do povo pobre, praticados em nome do Estado democrático de Direito brasileiro, teceram um conjunto de denúncias com suas respectivas provas e testemunhos, para apresentá-los no recinto do Tribunal Popular, sob a forma de análises e denúncias orais, depoimentos, farta documentação, filmes, teatro e música.

Através de reuniões semanais ou quinzenais, às quais foram se agregando paulatinamente entidades de direitos humanos, sindicatos e militantes, foi se desenhando o que constituiriam posteriormente as quatro sessões de instrução do Tribunal.

A idéia mestra que soldou esta construção foi a constatação de que o Estado democrático de Direito que temos desde a Constituição de 1988 comete sistematicamente graves violações de direitos humanos. Porém, os alvos privilegiados dessas ações, são as parcelas mais pobres da população brasileira, em especial os negros e indígenas. Trata-se de um Estado penal, célere em aplicar prisões preventivas e manter presas sem julgamento pessoas que, na maior parte das vezes, cometeram – ou supostamente cometeram – pequenos delitos contra o patrimônio dos ricos ou trabalham, para seu sustento, no varejo do comércio de drogas. Por outro lado, esse mesmo Estado penal aplica a esses crimes – o “tráfico” de drogas é denominado de “crime hediondo” – penas colossais. Nos casos de prisões de indígenas, pesa contras as lideranças a denúncia de formação de quadrilha ou bando, esbulho possessório, cárcere privado, seqüestro, etc. O Estado brasileiro arbitrariamente usou, por exemplo, dos códigos processual e penal para criminalizar a ação das comunidades indígenas na retomada de seu território tradicional, direito conquistado e garantido na Constituição Federal de 1988.

E mais ainda, depois do julgamento, é esse mesmo Estado penal que não respeita as garantias previstas em sua própria Lei de Execuções Penais, em grande parte pela omissão e inoperância do Poder Judiciário, muitas vezes agindo assim de maneira deliberada. Além disso, tal Estado tem também seu lado exterminador. Conforme relatório preliminar de Philip Alston, relator da Organização das Nações Unidas para execuções sumárias e extrajudiciais, apresentado à ONU em maio de 2008, os policiais militares e civis mataram em serviço e fora de serviço, muitas vezes prestando serviços extras à empresários, latifundiários e ou em grupo de extermínio e milícias. Porém nenhuma investigação é feita em relação ao pretexto para a execução, isto é, o suposto confronto. Todo caso é classificado de “Resistência Seguida de Morte” ou “Auto de Resistência”, e a investigação se concentra na vida do morto. Sabe-se que os policiais são preparados ideológica e tecnicamente para matar.

Por outro lado, os movimentos populares e sindicais que têm se organizado para construir uma sistemática defesa dos direitos violentados têm sido duramente punidos, seja com a repressão policial direta, ou por meio de arbitrários processos judiciais, que impõem pesadas multas e “interditos proibitórios”, restringindo o livre direito de organização sindical dos trabalhadores.

A idéia de realização de um Tribunal Popular para analisar profundamente e julgar alguns crimes institucionais emblemáticos, inverte radicalmente esta lógica unilateral. Inspirado, entre outros exemplos, no Tribunal que julgou o Estado estadunidense pelo descaso às vítimas do Furacão Katrina, em New Orleans (2007), e no “Tribunal Tiradentes”, que em 1983 julgou os crimes cometidos em nome da Lei de Segurança Nacional, em evento no TUCA/PUC-SP, construímos um Tribunal de caráter crítico, formativo, articulador e mobilizador.

As quatro Sessões para instrução da acusação do estado brasileiro naquele ano:

1ª Sessão de instrução: Violência estatal sob pretexto de segurança pública em comunidades urbanas pobres: dentre outros, o caso do Complexo do Alemão no Rio de Janeiro

2ª Sessão de instrução: Violência estatal no sistema prisional: a situação do sistema carcerário e as execuções sumárias da juventude negra pobre na Bahia

3ª Sessão de instrução: Violência estatal contra a juventude pobre, em sua maioria negra: os crimes de maio/2006 em São Paulo e o histórico genocida de execuções sumárias, o sistema prisional paulista, a violência institucional e a morte de jovens na Fundação Casa

4ª Sessão de instrução: Violência estatal contra movimentos sociais e a criminalização da luta sindical, pela terra e pelo meio-ambiente

Em sua Sessão final de acusação e defesa, foi pedido por parte da acusação a pena máxima para o estado capitalista opressor, que foi acatada pelos jurados e proferida pela Juíza, que ainda provocou alegando que, para o cumprimento da pena havia a necessidade de mobilização permanente dos grupos que ali estavam defendendo assim o pedido da acusação.

Diante de toda a construção e constatações nas sessões do Tribunal Popular, a decisão foi da permanência da mobilização do Tribunal Popular, que passou a receber denúncias e organizar ações para que as violações contra, principalmente a população empobrecida praticada pelo estado brasileiro

O Tribunal Popular da Terra

“Por onde passei, plantei a cerca farpada,
plantei a queimada.
Por onde passei, plantei a morte matada.
Por onde passei, matei a tribo calada,
a roça suada,
a terra esperada…
Por onde passei, tendo tudo em lei, eu plantei o nada.”

Pedro Casaldáliga

Ao longo desses dois anos, o Tribunal Popular, vem se consolidando como importante espaço de articulação dos diversos grupos que lutam contra a perversa lógica opressora do capital que tem criminalizado, encarcerado e exterminado considerável contingente da classe trabalhadora empobrecida.

Para esse ano (2011), estamos organizando o Tribuna Popular da Terra, para discutir a situação das populações no campo e na cidade, na perspectiva de discutir terra e territorialidade, quando discutiremos as opressões que aumentaram no campo em decorrência do neodesenvolvimentismo , que tem nas obras do PAC o carro chefe, o que tem provocado enorme opressão e deslocamento dos diversos grupos que tem sua vida baseada no campo (Indígenas, Quilombolas, Caiçaras , Ribeirinhos, Lutadores pela Reforma Agrária) e ainda, pescadores.

E para debater também, em função dos megaeventos (Copa e Olimpíadas), que tem como propósito a reorganização das cidades para que elas se adéqüem aos interesses econômicos em detrimento dos interesses da população de forma geral, as ações que removerão grandes contingentes de trabalhadores moradores em áreas de interesses principalmente do setor imobiliário.

A proposta do Tribunal da Terra, tem como norte, criar espaços de identificação das violações que ocorrem nesse último período, proporcionar o reconhecimento das violações ocorridas nos grupos específicos, estimulando o rompimento do olhar fragmentado sobre a opressão, criando uma rede de solidariedade das diversas lutas existentes contra as opressões.

Para iniciar esse processo, estamos sugerindo em princípio a discussão em quatro eixos temáticos, que são:

1 – Povos da Terra X Agronegócio

“Malditas sejam

todas as cercas!

Malditas todas as

propriedades privadas

que nos privam

de viver e amar!”

Do poema Terra Nossa, Liberdade,

Dom Pedro Casaldáliga,

O Agronegócio apresenta-se como um setor de atividade econômica que se diferencia de outros setores pela terra apresentar-se como o fator de produção essencial, porém, segue o mesmo script dos demais setores de atividade econômica capitalista, pois possui a contradição entre a produção social e a acumulação privada.

O resultado de seu movimento pode ser resumido em alguns fenômenos:

Concentração da riqueza social produzida no campo e a concentração da terra;

As novas tecnologias de ganhos de produtividade e eficiência possuírem um forte impacto ambiental[1], além de criar uma forte dependência das zonas do mundo produtoras agrícolas com baixa composição tecnológica em relação aos centros do mundo que inovam com tecnologias de insumos químicos (transgênicos, fertilizantes, corretivos etc.), máquinas e equipamentos agrícolas;

Outro fator que deve ser considerado pelo alto consumo de agroquímicos são as contaminações de águas subterrâneas ou superficiais, condenando a biodiversidade das regiões afetadas;

Redução da intensidade de trabalho no campo, o resultado desta equação é o aumento nos níveis de desemprego nas regiões de produção do agronegócio co-existindo com práticas criminosas de trabalho escravo;

A concorrência internacional e a pressão do mercado externo obrigam as empresas agrícolas a ocuparem novas áreas de acumulação de capital nas regiões agrícolas, atingindo biomas que pertencem a comunidades de povos da terra ou biomas que são áreas de reserva ambiental (impacto social e ambiental).

Deve-se lembrar que o agronegócio também possui diversos impactos nas zonas urbanas: por meio de pressão demográfica, por pressão inflacionária na cesta de consumo de alimentos ou por padrão fitossanitário do alimento consumido nos centros urbanos. Todavia, as primeiras vítimas do movimento do agronegócio são os povos da terra: os trabalhadores rurais, os povos indígenas (povos originários), os quilombolas ou moradores da floresta. Em suma, uma gama diversificada de povos que vivem da terra são atingidos pelo movimento do capital nas regiões de produção agrícola ou de extração de produtos da terra. O movimento do capital possui um funesto impacto ambiental com conseqüências globais: reservas florestais devastadas para pasto ou produção de soja; o mercado de carbono, por exemplo, produz verdadeiros desertos verdes de eucalipto (alterando de maneira predatória os recursos hídricos da região de plantio); o padrão de consumo energético determinando construções de plantas-de-produção de energia em reservas ambientais (hidrelétricas, térmicas etc). O Tribunal Popular da Terra deve trabalhar a contradição entre povos da terra x agronegócio, interesses inconciliáveis cujo futuro social e ambiental do planeta terra está em jogo.

2 – Acumulação de Capital e a Funcionalidade da Cidade

“A existência da cidade implica imediatamente a necessidade da administração, da polícia, dos impostos, etc., numa palavra, a necessidade da organização comunitária, partindo da política em geral. É aí que aparece em primeiro lugar a divisão da população em duas grandes classes, divisão essa que repousa diretamente na divisão do trabalho e nos instrumentos de produção. A cidade é o resultado da concentração da população, dos instrumentos de produção, do capital, dos prazeres e das necessidades”

[A Ideologia Alem㠖 Marx K. e Engels F. p.62]

A formação da cidade apresenta-se como o início de uma existência do Capital independente da propriedade fundiária, tendo por base um tripé: a propriedade, o trabalho e as trocas. As cidades foram formadas por “verdadeiras associações” motivadas pela defesa dos interesses imediatos na produção e na acumulação de capital, um complexo voltado para a defesa da propriedade, da ampliação dos meios de produção e da ampliação da produção e apropriação privada da riqueza social produzida.

Deve-se observar que entre 1940 e 1980 a população brasileira passou de predominantemente rural para predominantemente urbana, ou seja, repensar o desenho agrário brasileiro passa por modificar o modelo político e econômico brasileiro, mas a questão urbana é a garantia de mudança direta na vida de milhões de homens e mulheres historicamente esquecidos. Este movimento sócio-territorial (um dos mais rápidos e intensos do mundo) é balizado por um desenvolvimento urbano que priva a parcela pobre da cidade a ter acesso aos aparelhos da cidade. As periferias das cidades do Brasil são castigadas pelas enchentes, pelo precário fornecimento de energia elétrica, pelo escasso acesso ao saneamento básico, água, esgoto etc.

Além de excludente, este modelo é extremamente concentrador, e concentra economicamente e demograficamente:

Observa-se, por exemplo, que 50,1% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil está concentrado em 1,2% das cidades do Brasil. Ou seja, 66 municípios, de 5.564 municípios do Brasil, segundo dados do IBGE, para o ano de 2007;

Enquanto que aproximadamente 50% da população do Brasil está localizada em apenas 190 municípios, ou seja, apenas 3,4% das cidades do Brasil concentram metade da população do Brasil;

As qualidades urbanas estão restritas as “áreas de mercado”, aos locais de negócio e consumo de uma minoria. Nota-se que estas “áreas de mercado” são regulamentadas por um vasto e complexo sistema de normas, de leis e contratos, e a condição sine qua non para ingressar na “Disneylândia” da cidade é a propriedade escriturada e registrada.

Algumas questões fortalecem esse sistema perverso de cidade e que devem ser consideradas em uma administração que aponte para a necessidade de superar os marcos da forma social do valor que se valoriza:

A demarcação imobiliária (sistema de legislação urbanística ou ambiental), a constituição de uma nova demarcação que estabeleça o forte compromisso com a ocupação do solo de maneira ambientalmente sustentável e socialmente justo.

A superação de um sistema de créditos burocráticos e fora da realidade da população pobre da cidade.

Os assentamentos humanos precários, ou as favelas, é algo presente em todas as regiões do Brasil, normalmente estas regiões possuem marcas semelhantes de norte a sul. Entre estas pode-se destacar:

1 – As famílias que vivem nestas regiões possuem um salário baixo e insuficiente para cobrir os custos de moradia;

2 – Falta de recurso técnico e ausência do poder estatal para garantir condições mínimas de moradia, e quando o Estado não é ausente os recursos são escassos, mas a repressão e a violência institucional contra a população pobre tornam-se a marca de presença do poder estatal;

3 – O espaço ocupado é terra rejeitada pela legislação ambiental e urbanística para o mercado imobiliário;

Assim, inicia-se a produção da cidade fora dos marcos legais da cidade, criando uma cidade regular e uma cidade irregular, a mais brutal reprodução da desigualdade na construção da cidade. A contradição capital x trabalho, faz o seu registro na construção da forma cidade. Da divisão social do trabalho nascem as graves desigualdades regionais: econômicas e demográficas.

Como se não bastasse os desequilíbrios regionais, existem fortes contradições internas nos grandes centros urbanos concentradores de contingentes populacionais e de riqueza. A concentração de oportunidades em um fragmento da cidade, é por exemplo, uma grande contradição, a periferia da cidade está cada vez mais distante das oportunidades. Esta forma de contradição interna, entre centro e periferia, impõe também uma lógica ambiental predatória. Seja para o deslocamento do contingente populacional ou pela forma de ocupação do solo. O Tribunal Popular da Terra deverá debater a terra e a territorialidade no espaço urbano, o papel da especulação imobiliária, zonas industriais ou zonas da nova economia determinando um desenho urbanístico que seja funcional com o padrão de acumulação de capital dominante em uma determinada região geográfica, esse modelo condena um vasto contingente populacional as mais diversas intempéries: de desastres ambientais, a falta de serviços básicos ou a violência em sua forma mais clara.


3 – Disputa da Terra e da Territorialidade

“Na luta de classes, todas as armas são boas: pedras, noite e poemas.”

(Leminski)

A definição ocidental de Estado democrático é aquele em que exista o exercício pleno de eleições livres e diretas, a liberdade de imprensa e o pleno Estado de direito. Deve-se exercitar a transcendência e superar a forma democracia apenas no campo jurídico ou político institucional, passando a pensar no Estado democrático também no campo do econômico.

O acesso a terra, às riquezas naturais, aos bens e serviços produzidos por um país deve entrar na equação que “mede” o nível de democracia e de respeito aos direitos humanos. Uma democracia sólida, inevitavelmente, possuirá uma riqueza democratizada. Deve-se inventar uma equação que agregue questões como o acesso ao poder pol